Campeão na produção de etanol, Brasil tem vantagens na era do hidrogênio verde

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Combustível limpo à base da biomassa de cana-de-açúcar tem alto teor de hidrogênio e não exige adaptação na infraestrutura de distribuição.

Destaque internacional na produção de etanol, feito à base de cana-de-açúcar, o Brasil pode entrar mais rápido na era do hidrogênio verde. O combustível líquido, usado para abastecer motores de veículos há pelo menos quatro décadas no país, é um tipo de biomassa de alto conteúdo de hidrogênio. O segredo está na química: cada molécula de etanol tem três átomos de hidrogênio para cada átomo de carbono. É quase o dobro do que carrega a gasolina (1,62 átomo de hidrogênio para cada carbono), explica Plínio Nastari, presidente do Instituto Brasileiro de Bioenergia e Bioeconomia (IBIO). 

“O Brasil é campeão. Não tem país que se compare com a atuação do país nessa área”, afirma Nastari. “E extrair hidrogênio verde do etanol, fonte de energia renovável, é perfeitamente possível”, complementa.

Um dos caminhos apontados por Nastari é a eletrificação dessa biomassa na área de mobilidade. Ou seja, do etanol, que move 48% da frota nacional atualmente, o hidrogênio verde pode ser extraído para abastecer veículos elétricos. A transformação acontece numa célula de combustível instalada no próprio carro. O componente chamado reformador faz a separação do hidrogênio contido na molécula do etanol. Na sequência, um outro componente, o reator, converte o hidrogênio em eletricidade que, por sua vez, alimenta o motor.

“As montadoras têm se referido ao Brasil como um país que já resolveu as questões de infraestrutura de hidrogênio verde por já ter instalada toda a infraestrutura do etanol”, pontua o presidente do IBIO, que foi membro do Conselho Nacional de Política Energética como representante da sociedade de civil de 2016 a 2020. Em todo o território nacional, os mais de 42 mil postos de combustível não precisariam de qualquer adaptação para fornecer etanol à frota movida à hidrogênio verde.

“O nosso objetivo é focalizar o hidrogênio obtido do etanol”, confirma Edmundo Barbosa, presidente do Sindalcool Paraíba, a visão de Plinio Nestari. Na opinião de Barbosa, a obtenção de H2 por eletrólise nesse momento é complexa devido ao momento difícil da crise hídrica.Uma outra opção de conversão de biomassa em hidrogênio verde passa por processos biológicos que envolvem o biogás e o biometano. No Brasil, por outro lado, esse é um caminho ainda a ser percorrido, comenta Barbosa. “A Alemanha tem 12 mil instalações de biogás e biometano. O Brasil tem 620 de biogás e três apenas de biometano”, diz Barbosa, para efeito de comparação. “Esse é um grande filão e será explorado nos próximos anos, já que hoje o biometano é um dos biocombustíveis incentivados pela política nacional de biocombustíveis no país”, adiciona.

O biometano é avaliado como uma forma excelente do resíduo que sai atualmente das usinas, que é a vinhaça da cana-de-açúcar. O produto é aproveitado na fertirrigação, porpem, na visão de Barbosa, poderia ser ainda melhor usado na obtenção de biogás e biometano. “Queremos exportar H2V para a Alemanha e União Europeia. Esse é o nosso foco. As usinas de etanol poderão fornecer hidrogênio verde para a siderurgia e outras indústrias evitando, desse modo, as volumosas emissões de CO2 tanto do gás natural, quanto de outras fontes fósseis”, argumenta Barbosa.

Segundo Ansgar Pinkowski, gerente de Inovação e Sustentabilidade e Business Scout for Development da Câmara de Comércio Brasil Alemanha (AHK Rio), o uso da biomassa pode ser uma excelente rota tecnológica nacional para a produção de hidrogênio. Assim, o país conseguiria usar toda a sua excelente capacidade de produzir hidrogênio verde, através de eletrólise, para atender outros países e se tornando um importante player neste novo mercado. Pinkowski ressalta, ainda, que a crescente demanda do mercado interno poderia ser atendida através de hidrogênio com base em biomassa. “E quem sabe em um futuro próximo, o Brasil consiga desenvolver tecnologias que possam ser exportadas para outros países, tendo como base a longa tradição de produção e uso do etanol”, adiciona.

Esse é um dos motivos que fizeram com que Adalberto Arruda, advogado na área ambiental, levasse o debate para o setor sucroalcooleiro de Pernambuco. O estado é o segundo no Nordeste em produção de cana-de-açúcar, com 11,7 milhões de toneladas na safra 2020/2021. “O tema do hidrogênio verde a partir do etanol começou a ser pensado pelo setor, que achou interessante. Vejo boas chances de avançarmos objetivamente nesse sentido”, afirmou Arruda.

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